Tudo bem que a corrida atraia muita gente justamente por ser uma modalidade individual e independente – basta colocar um bom par de tênis e sair por aí. Mas também é fato que há tempos deixou de ser uma atividade solitária. Tanto que os grupos de corrida estão se multiplicando em diferentes segmentos e formas. A novidade, agora, em São Paulo, é a reunião do clube da Luluzinha para correr. O que move essas mulheres? A conquista de um corpo sequinho, firme, é um ponto importante, do mesmo modo que ganhar fôlego, disposição, energia. Encontrar as amigas também conta, assim como ter um tempo para si própria, esquecer os problemas do dia-a-dia. Se você pode obter todos esses benefícios ao ar livre, admirando o céu, as árvores, os pássaros, melhor ainda. A fuga da academia, vale ressaltar, para muitas mulheres soa como música. O próprio interesse do público feminino pela corrida tem aumentado bastante. Há dez anos, havia apenas uma mulher inscrita em cada grupo de dez atletas nas provas de rua. Hoje, esse número varia entre três e quatro. Era de esperar, então, que as corredoras buscassem planos de exercícios, orientação e acompanhamento técnico específicos à sua natureza, além da convivência com companheiras que dividem os mesmos problemas e interesses.
a união faz a força"A identificação e a integração entre as mulheres funcionam como um grande incentivo, permitindo que os objetivos dessas alunas – como emagrecer ou melhorar o condicionamento físico –, sejam atingidos com mais facilidade", diz Eliana Reinert, ex-atleta profissional e técnica do Projeto Correr Mulher. Nos grupos exclusivamente femininos, ela explica, as trocas e os vínculos acontecem o tempo todo e muitas sentem que, por maior que sejam as dificuldades, terão ajuda e suporte profissional diferenciado.
Adotar um plano especial, individualizado e dinâmico, sem cobranças exageradas, receber atenção exclusiva, identificar bem cada evolução são outras vantagens apontadas por Eliana, que ainda destaca a atmosfera intimista e o fato de cada aluna se sentir acolhida e à vontade. "Mas o melhor de tudo é perceber que o exercício fica incorporado à vida dela, passa a ser essencial."
Até mesmo grupos tradicionais e conceituados, como o Run for Life, comandado pelo treinador esportivo Wanderlei de Oliveira, têm agora a sua versão feminina, o Run for Life Women. As praticantes são lideradas pelas professoras Mônica Peralta e Simone Machado, que também são maratonistas. "No caso do público feminino, o estímulo do grupo é essencial e ajuda muito no desempenho. As mulheres conversam, falam de assuntos diversos, o tempo passa mais rápido. Enfim, é uma 'festa' só", conta Mônica, que resume o lema da proposta em poucas palavras: saúde, lazer, divertimento e qualidade de vida.
curvas em dia
Engana-se quem pensa que, nesses grupos, a única "tarefa" das integrantes é correr. O trabalho inclui alongamento, ginástica localizada e acompanhamento nutricional. A ginástica localizada é focada no corpo da mulher – ênfase em coxas, bumbum e barriga. A estética conta, e muito! – mas a finalidade desses exercícios é também deixar o corpo mais forte e flexível, melhor preparado para uma atividade de grande impacto como a corrida. Por isso, a ginástica vai muito além da localizada tradicional, incluindo movimentos de pilates e do treinamento funcional, métodos "inteligentes", que enxergam o corpo de maneira integrada.
"Nosso foco é qualidade de vida, prevenção de doenças e, claro, manutenção e melhora da forma física", diz Adriana Placsek, que já foi triatleta profissional e hoje coordena o grupo TPM – Treinamento para Mulheres. As atividades desenvolvidas, ela diz, também dão aquela bombada na auto-estima. "Algumas mulheres chegaram aqui sedentárias e hoje correm meia maratona. Isso é maravilhoso. Nós as incentivamos, também, a cuidar da alimentação – e por isso a maioria emagrece e fica em ótima forma", diz Adriana. E a nutrição é um pilar fundamental. "Mostramos que não adianta se exercitar e não cuidar da dieta. O conceito de alimentação saudável tem que caminhar junto com o de treinamento físico em todos os casos, especialmente no das mulheres, sempre mais preocupadas com o controle do peso", diz Cristina Carvalho, professora de educação física e diretora do Projeto Mulher.
A rotina de treino
Cada grupo é composto de 10 a 15 mulheres e acompanhado por professoras de educação física e auxiliares (pelo menos duas profissionais estão sempre presentes). As participantes recebem planilhas de acordo com suas necessidades e objetivos. A avaliação física, antes de começar, é obrigatória.
Os treinos acontecem em praças e parques espalhados pela cidade de São Paulo. Os horários variam entre manhã e noite, e as aulas duram de uma a duas horas. Os equipamentos para os exercícios localizados e alongamento – colchonete, pesinhos, cama elástica, elásticos – são levados pela professora.
No final, rola uma energia para lá de contagiante nessas confrarias femininas, vale a pena experimentar. Tênis no pé e boa sorte!
inspire-se nelas
"É minha terapia e academia! Comecei a correr há 15 anos, sem orientação. Pouco tempo depois conheci a Eliana, personal trainer, e passei a fazer treinos supervisionados. Recentemente, ela criou o Projeto Correr Mulher. É o máximo, principalmente porque a gente sofre toda a pressão do mundo – família, trabalho, casa... Ajuda até mesmo no equilíbrio emocional. Há pouco tempo sofri uma perda dolorosa, durante vários dias corri chorando, e fui muito amparada."
Mara Pezzotti, 41 anos, diretora de marketing
"Meu corpo está definido. Quando era mais nova, fiz natação, equitação, balé... Mas faltava regularidade e motivação. Há cerca de um ano, quis encontrar um esporte que tivesse a ver comigo e minha irmã sugeriu a corrida num grupo feminino, o TPM. A preguiça acabou no ato, me encontrei, adoro. É alegre e divertido, pratico atividade física conversando o tempo todo. Sem falar que estou atingindo minha meta, um corpo mais durinho e definido."
Yayá Torre, 25 anos, gerente de produção
"É animado, não dá preguiça. Não tenho grandes metas em relação à performance, quero apenas manter a forma, poder comer e beber com prazer – a proposta do Projeto Mulher é perfeita para mim. As turmas são animadas, uma incentiva a outra, não dá preguiça. A orientadora marca em cima, manda torpedos perto do horário se não aparecemos. O fato de não precisar freqüentar academia também conta. Não quero saber de outra forma de malhação."
Cláudia Gatti Ferreira, 45 anos, empresária
"Corrida no lugar da depressão. A atividade física entrou na minha vida de forma salvadora: resolvi substituir um tratamento psiquiátrico pelo esporte – eu tinha sofrido uma perda muito forte e estava com depressão. No começo ingressei no grupo misto, depois migrei para o Run for Life Women. É extremamente motivante: as mulheres não focam apenas na estética, buscam qualidade de vida e crescimento espiritual. Fiz várias amizades."
Carla Tanaka, 35 anos, arquiteta e empresária
OUTRAS TRIBOS
Há vários grupos de corrida em São Paulo (e no resto do Brasil). Os pioneiros são mistos, como o Run for Life, de Wanderlei de Oliveira, o Run&Fun , do treinador Mario Sérgio Andrade Silva, e o do técnico Marcos Paulo Reis, todos com ampla atuação na área de esporte e que preparam para provas de triatlo e maratonas. Existem também os direcionados para funcionários de empresas, caso do Pão de Açúcar e do Hotel Hyatt.
Há entidades, inclusive, como a Inthegra, que implementa e coordena grupos de corrida e caminhada em empresas (Coca-Cola, Oi, Sul América). "Fundamos o Stay Fit este ano para os funcionários do Hotel Hyatt, de todos os departamentos e níveis hierárquicos, para promover a saúde, o bem-estar e o entrosamento social. O programa inclui palestras e dicas de alimentação, além de exercícios de fortalecimento muscular voltados para a corrida", explica Ana Lucia Thompson-Flôres, gerente do hotel. "Acredito que o treinamento feito em grupo é o grande responsável pela fidelização e evolução do aluno. Por isso o trabalho das assessorias esportivas cresceu tanto nos últimos anos", diz Mario Sérgio, da Run&Fun.
Além do ganho estético, as pessoas mudam seus hábitos de vida, ampliam o círculo social e incorporam, muitas vezes para sempre, a atividade física à sua rotina. "O lado alegre, motivacional, influencia muito", acredita o treinador. O nível de seriedade e profissionalização é alto. Muitos grupos dispõem de equipes multidisciplinares formadas por ortopedistas, fisioterapeutas, psicólogas e nutricionistas. E ainda fazem acompanhamento dos alunos em provas no Brasil e no exterior – maratonas do Rio de Janeiro, Nova York, Chicago. Em resumo, para correr em grupo, basta querer, as opções são inúmeras!